quarta-feira, 16 de maio de 2018

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Como se tornar um acadêmico “de sucesso” e respeitado cientificamente

Ingredientes
1 ou 2 graduações
1 ou 2 mestrados
1 doutorado (de preferência no exterior ou realizado parcialmente no estrangeiro)
2 ou mais pós-doc (obrigatoriamente feitos na Europa ou EUA)
Arrogância (à vontade; aliás, quanto mais, melhor)
Má-educação (à vontade, mas controlada de acordo com o público-alvo)
Uso de expressões em idiomas estrangeiros

Modo de preparo
Faça sua primeira graduação. Se achar conveniente, faça a segunda. O mais interessante mesmo é realizar as duas ao mesmo tempo e, anos depois, comentar: “fazia dois cursos e ainda sobrava tempo!”.
Faça um mestrado. Se quiser, faça outro. Mas tome cuidado, pode “pegar mau”, afinal de contas, o que vale mesmo é ser DOUTOR e não mestre ao quadrado. Acrescente um pouco de arrogância, mas lembre: você ainda é só um mestre.
Doutorado: pleno no exterior ou, pelo menos, com um ou dois anos no estrangeiro. Publique. Publique mais. De preferência em outra língua. Melhor ainda se for em outras duas línguas. Acrescente mais doses de arrogância. Parabéns, agora você já é doutor/a! Comece a adicionar má-educação no seu dia a dia, mas cuidado: adicione aos poucos e diferentemente de acordo com o público: para alunos de graduação e pessoas que não pertencem ao meio acadêmico, altas ou moderadas doses; para mestres e outros doutores recomenda-se doses baixas (você ainda precisa fazer seus pós-doutorados).
Faça um pós-doc na Europa. Comece a utilizar, cotidianamente, expressões em idiomas estrangeiros enquanto fala com as pessoas no Brasil e, especialmente, durante as suas aulas.
Faça um pós-doc nos Estados Unidos (pode ser o primeiro nos EUA e o segundo na Europa. Mas precisam ser necessariamente os dois no Norte). Parabéns, você é pós-doutor ao quadrado! Agora já é possível adicionar arrogância à vontade: quanto mais, melhor. Sempre lembre a todos dos seus artigos publicados no exterior e os livros que organizou e escreveu.
Adicione mais má-educação. Com graduandos, mestrandos e doutorandos, uso liberado. Com colegas de departamento e outros intelectuais, uso moderado.
Publique mais, de preferência no exterior.
Parabéns, você já se tornou um acadêmico “de sucesso” e respeitado cientificamente. Humilhar os que ainda não chegaram ao seu nível é permitido. 

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Colegas ou concorrentes?


Há alguns anos atrás, na época da maratona de vestibulares, vivi uma experiência no mínimo curiosa. Era um daqueles vestibulares seriados, que se presta no final de cada um dos três anos do Ensino Médio. Já se tratava da última fase – a decisiva – e era para um curso bastante concorrido de uma universidade muito renomada.

Entrei na sala, procurei minha carteira. Havia uma etiqueta com o meu nome completo e o curso para o qual eu estava pleiteando uma vaga. O rapaz ao meu lado – que por sinal era meu xará – também estava prestando para o mesmo curso que eu. Já o rapaz sentado na minha frente queria outra carreira, mas havia estudado junto com o que estava ao meu lado.

– E aí, foi bem nas etapas anteriores?

– Ah, melhor não comentar, né. Tem um concorrente aqui do meu lado... – respondeu meu xará à pergunta de seu colega.

Durante as três ou quatro horas de duração da prova, o rapaz soltava frases como “que fácil!”, “nossa, que pergunta besta”, “já passei”, bem baixinho, para os fiscais não reclamarem, mas em volume suficiente para que eu pudesse ouvir. Além disso, de quando em quando fazia algum movimento com o braço, representando que estava indo bem, que estava fácil. Tudo para tentar me desestabilizar psicologicamente. Tentativas para, de alguma maneira, fazer com que eu ficasse com “medo” dele, que não me sentisse capaz, enfim, para “garantir” que ele iria melhor na prova e que uma das vagas fosse dele (como se o fato de ele querer uma das vagas tivesse como consequência necessária que nenhuma das outras pudesse ser minha).

“Que tolo”, constatei. Quando eu havia visto que ele prestava a mesma carreira, tinha pensado: “que legal! Pode ser que sejamos futuros colegas de classe!!”. 

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

São Sebastião: o santo católico protetor dos/as homossexuais


Sebastião, que após seu martírio e morte passaria a ser denominado São Sebastião, nasceu em Narbonne – atualmente localizada na França – no século III. Ainda muito jovem muda-se com a sua mãe e o seu pai para Milão, na Itália, onde crescerá e será educado. Sua mãe era cristã, apesar de àquela época o cristianismo ainda ser proibido no Império Romano, e ensinou os valores cristãos ao seu filho. Seu pai morreu enquanto Sebastião ainda era muito jovem.
            Entrou para o exército do Império Romano e logo se destacou, chegando mesmo a ser chefe da guarda imperial. Diz-se que era um dos soldados que o imperador daquela época, Diocleciano, mais gostava. No entanto, Sebastião tinha que manter em sigilo a sua condição de cristão, uma vez que estes não eram aceitos e eram perseguidos àquelas alturas. Assim, ele possuía uma vida dupla: a de soldado romano exemplar; e a de cristão praticante, isto é, ajudava aos doentes e tinha um comportamento brando com os prisioneiros cristãos.
            Há relatos de que Sebastião, durante a vida, ajudava os leprosos e rezava por eles. Isto lhe rendeu, após sua morte, o título de santo protetor contra as doenças contagiosas e infecciosas.
            Entretanto, Sebastião foi denunciado ao imperador Diocleciano por ser cristão. Como o imperador tinha muito apreço por aquele soldado, deu-lhe a chance de negar o cristianismo, mas Sebastião não aceitou. Assim sendo, o imperador ordenou que ele fosse amarrado a uma árvore e que os arqueiros o atirassem flechas, sem, no entanto, acertar seus órgãos vitais, para que a morte fosse mais lenta e dolorosa. Feito isto, deixaram-no amarrado à árvore.
            Irene (que depois de morta viria a se tornar Santa Irene) foi até o local, a fim de dar um sepultamento digno a Sebastião, e se surpreendeu ao encontrá-lo ainda vivo. Levou-o para sua casa e cuidou de seus ferimentos até que ele se recuperasse.
            Ao invés de se esconder, Sebastião, depois de recuperado, foi procurar o imperador Diocleciano, com a intenção de mostrar-lhe a injustiça que estava a fazer com os cristãos. O imperador, ao ver que ele ainda estava vivo e a defender os cristãos, manda que o espanquem até a morte. Isto acontece no dia 20 de janeiro do ano de 288 e, por causa disto, o dia 20 do mês de janeiro é considerado o dia de São Sebastião.
            Seu corpo é jogado no esgoto, mas Luciana (depois, Santa Luciana), consegue resgatá-lo para sepultá-lo. Antes de o cristianismo ter se tornado a religião oficial do Império Romano, no século IV, com Constantino, Sebastião já era venerado como santo.
            No ano de 680, os restos mortais de Sebastião são transferidos para Roma. Àquela época, a cidade sofria de uma peste. No dia em que os restos mortais chegaram, entretanto, houve o fim da peste, o que rendeu a São Sebastião outro título: o de santo protetor contra as pestes e as epidemias.
           
Além de ser conhecido como o santo protetor contra as doenças infecciosas e contagiosas e como o protetor contra as pestes e epidemias, São Sebastião também é tido como o santo padroeiro dos/das homossexuais. Obviamente, esta denominação foi atribuída pelos próprios gays e lésbicas, e não pela Igreja Católica.
São Sebastião levou uma vida dupla, pois não podia assumir a sua condição de cristão, isto é, ele teve de esconder a sua religiosidade das autoridades romanas, assim como muitos/as homossexuais escondem a sua sexualidade. Ele foi condenado à morte por assumir a sua condição de cristão, perante o imperador Diocleciano, mas não negou a sua identidade, ainda que à custa de sofrimento e sacrifício.
Estes fatos da vida do santo fizeram com que artistas homossexuais, no século XIX, apropriassem-se da sua história para criar uma referência gay no catolicismo, ou seja, um santo que fosse o protetor dos/das homossexuais. Entre estes artistas, o mais famoso foi Oscar Wilde, o qual foi condenado à prisão, em 1895, por “práticas contra a natureza”. Wilde era homossexual assumido e, no cárcere, converteu-se ao catolicismo e passou a adotar o pseudônimo de Sebastian, por ser devoto de São Sebastião.
Outro fato que ajudou na escolha deste santo como protetor dos homossexuais foi por ele, na maior parte das vezes, ter sido pintado – em alguns casos por artistas reconhecidamente gays – como um belo jovem, seminu, amarrado a uma árvore e com pose e expressão muitas vezes consideradas afeminadas.
Por fim, mais um fator que contribui para esta associação de São Sebastião aos homossexuais foi o fato de ele ser considerado o santo protetor contra as doenças infecciosas: se na Idade Média era ele o protetor contra a lepra, hoje em dia ele é tido como o protetor contra a AIDS. E, como se sabe, quando descoberta, a AIDS foi estigmatizada como a “doença dos gays”. 
Portanto, por ter levado uma vida dupla, escondendo a sua condição de cristão, mas, ao mesmo tempo, quando descoberto, tendo a coragem de assumir sua situação ao invés de negá-la; por ser representado, na maior parte das vezes, como um jovem belo e com características afeminadas; e por ser considerado como o santo protetor contra as doenças infecciosas, São Sebastião ficou conhecido como sendo o protetor dos gays e das lésbicas. 

domingo, 30 de novembro de 2014

Ode à Solidão

Já namorei,
agora estou só.
Já convivi com muitos amigos,
no momento, prefiro minha própria companhia.

Descobri que morar sozinho
tem suas vantagens
Que comer só é ótimo
Ir ao cinema sem companhia pode ser interessante.

Não preciso estar cercado de pessoas
todo o tempo
para estar feliz.

Não tenho aversão às pessoas,
mas estou vivendo um momento
em que prefiro estar só. 

quarta-feira, 2 de abril de 2014

O diálogo complexo


Elx se recusa a se rotular.
Quando lhe perguntam “você é gay?”, responde “não”.
“Hétero?!”
“Também não.”
“Ué, então é assexual?”
“Não, não sou assexual.”
“Ah tá, entendi. Você é bi!”
“Também não, não sou bi.”
“Mas o que você é então?”
“Sou um ser humano que se interessa por outro ser humano, independente de seu gênero.”

Pessoas se apaixonam por pessoas.

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

O encontro e o celular


“Ai, meu Deus, vou me atrasar!”. O seu cabelo, como acontecia na maior parte das vezes, não estava lhe obedecendo. Olha para o espelho e pensa: “não, não está bom”. Mais uma tentativa: pomada, pente, laquê. Ok. Estava “menos ruim” agora. Válter estava muito ansioso. Depois já de alguns meses sozinho, finalmente tinha um encontro. “Preciso malhar mais...”, fala, em voz alta, ao olhar para o espelho novamente. Estava sozinho em casa e só lhe restavam mais dez minutos para acabar de se arrumar. Escovou os dentes (duas vezes, por precaução), passou mais perfume, deu uma última olhada no espelho. Desceu as escadas.

Eram onze horas em ponto quando, da janela da cozinha, Válter viu um carro estacionar em frente à sua casa. “Pontual”, pensou ele. Sacou rapidamente o seu smartphone do bolso e mandou um SMS: “É você? Buzina!”. Ouviu, imediatamente, duas curtas buzinadas. “Era ele”, constatou. Lucas havia chegado.

Estava em um carro cinza, importado. Válter respirou fundo, abriu a porta do carro e entrou. “E aí, seu chato, vamos dar uma volta então?”, disparou Lucas, sem tirar os olhos do celular que se encontrava em suas mãos. Vestia uma camiseta estilo polo da Hollister – a marca favorita dos gays, pelo menos naquela região – e já foi arrancando com o carro. Válter, por precaução, havia preferido combinar de darem uma volta pela cidade antes de voltarem para a sua casa, assim poderia analisar se não se tratava de um desequilibrado, maníaco, etc. Pelo menos foi isso o que justificou para Lucas. Sabia que era perigoso de qualquer modo, mas não estava com medo. Só queria se certificar de que valia mesmo a pena levar aquele rapaz para dentro de sua casa e, portanto, seria bom um pouco de conversa a fim de chegar a essa certeza.

Ao passarem pela avenida mais movimentada da cidade, o “point” noturno – não que naquele dia houvesse muito movimento, afinal de contas, era uma terça-feira – Lucas comentou estar com fome e resolveu parar em algum lugar para pedir um lanche. O restaurante já estava quase fechando, assim, Lucas perguntou, ainda sem descer de seu carro importado: “Ainda dá tempo de pedir um lanche?”. O funcionário do local analisou rapidamente o veículo em que os dois rapazes estavam e respondeu: “Claro, entrem!”.

Sentaram-se em uma das várias mesas que estavam vazias e Lucas começou a olhar o cardápio. O garçom, um senhor magro, grisalho, de aparência cansada e que, com certeza, já estava contando os minutos para ir embora, chegou à mesa e ficou, com um olhar levemente marcado pelo tédio, esperando os rapazes fazerem o pedido. Válter tinha jantado e não estava com fome. Pediu um suco de laranja sem açúcar. Seu acompanhante pediu o lanche que queria e, assim que o garçom levou o cardápio, retirou seu smartphone da calça e começou a digitar. Ele estava sem internet móvel pois havia esquecido de pagar a conta – assim tinha contado a Válter naquela noite, quando ainda se encontrava em sua casa, antes de combinarem o encontro –, mas o local em que estavam possuía wireless. Portanto, lá estava Lucas a checar seu celular.

“Natural”, imaginou Válter. “Ele deve estar olhando se não há algo de urgente...”. Mas Lucas não largava o celular e também não puxava nenhum assunto. Discretamente, Válter conseguiu ver o que o outro fazia em seu celular: WhatsApp, Facebook, e... Hornet! “Hornet?”, espantou-se. É verdade que eles haviam se conhecido por intermédio do aplicativo Tinder, mas qual era o propósito do rapaz em marcar um encontro, pessoalmente, e não largar o celular? E, ainda por cima, ficar checando o seu Hornet? “Era mais lógico eu ter ficado na minha casa, ele ter ficado na casa dele, e nós conversarmos pelo celular, ué”, constatou, cabisbaixo.

Para ver se Lucas se tocava da situação, Válter também pegou seu celular e começou a usá-lo. O outro nem percebeu, tão absorto que estava com suas próprias redes sociais. “Você é viciado em celular, ein?”, disparou, então, em outra tentativa de chamar a atenção. “Hehehe, nem sou”, Lucas respondeu, novamente sem o encarar. E então, de repente, mirou os olhos de seu companheiro e disse: “Vou ao banheiro, okay?”.

“Oh Céus, que tipo de encontro é esse em que a outra pessoa não larga o celular?”, questionou-se Válter.

Lucas voltou do banheiro, com o celular na mão, ainda digitando. O garçom veio à mesa, com o olhar agora já numa mescla entre tédio e raiva – além dos rapazes, só havia outro casal, um homem e uma mulher, no estabelecimento – e trouxe o lanche e o suco. Mas Lucas pareceu nem perceber a presença do lanche na mesa. Será que a fome havia passado? “Você não vai comer?”, Válter, já um pouco cansado da situação, perguntou. “Ah, vou, verdade”. Largou o celular e, rapidamente, comeu o lanche todo.

Depois de pagarem, Lucas ainda deu uma última olhadela em seu celular e, então, seguiram para o carro. “Viu só, eu não sou nenhum louco”, brincou. Estavam, agora, novamente em frente à casa de Válter. “Você quer entrar?”. “Bom, já que você está me convidando...”.

Válter usou a clássica desculpa de ver um filme, na verdade, um novo seriado gay. Lucas aceitou. Enquanto viam a primeira cena do seriado, Válter, sem prestar a menor atenção, pensava: “Finalmente, um encontro normal!”. Lucas, que estava deitado em seu colo, levantou-se para ir ao banheiro. Assim que voltou, eles se beijaram: “Aí sim”, animava-se Válter, afinal, já fazia um bom tempo que não ficava com alguém. O beijo foi ficando mais intenso, as mãos começaram a percorrer as costas. O clima esquentava. Mordidas no pescoço, primeiras insinuações de tirarem as camisetas. E, então, no meio de todo aquele quente amasso, Lucas pergunta:

- Qual a senha do seu wi-fi?